8 de outubro de 2024

Suicídio é questão de saúde pública e pode ser prevenido, dizem debatedores

30 de setembro de 201911min21
CDH - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Pessoas com tendência ao suicídio têm algum tipo de transtorno mental e precisam de atendimento médico de emergência seguido de tratamento de saúde por uma equipe multidisciplinar. E essas são ações que requerem uma articulação em rede envolvendo famílias, poder público e sociedade. Foi o que defenderam os participantes da audiência pública promovida nesta quinta-feira (26) pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), requerida pela senadora Leila Barros (PSB-DF). Eles debateram o movimento Setembro Amarelo, campanha nacional de conscientização sobre a prevenção do suicídio.

— Quem se suicida é porque está doente. E se suicidou porque não teve acesso a tratamento, porque o serviço não está bom, porque o atendimento não está bom — avaliou o médico Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina, e superintendente técnico da Associação Brasileira de Psiquiatria

Ele afirmou que o Brasil é o segundo país em casos de depressão no mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos.

Grupos de risco

O suicídio é a sexta maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil. De 2011 a 2017 foram registradas 80,3 mil mortes por suicídios no país, a maior parte nas regiões Sudeste e Sul. Intoxicação por agrotóxicos, enforcamento e armas de fogo são os meios mais utilizados. A média é de 11,5 mil casos por ano. Em 2017, esse número subiu para 13 mil.

Os dados foram apresentados por Mauro Pioli Rehbein, técnico da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde. Ele também descreveu as ações promovidas junto aos grupos de risco — como jovens, trabalhadores e indígenas — e o repasse de recursos para projetos de prevenção de suicídios nos estados com mais casos notificados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Piauí, Amazonas e Rondônia.

Agravantes

As estatísticas ajudam na elaboração de políticas públicas, e a aprovação da Lei 13.819, de 2019, que instituiu a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, também é um avanço, disse o representante do Movimento Vida e Paz, Nazareno Vasconcelos Feitosa. Mas é preciso compreender que não há uma razão única para o problema, declarou, apontando como fatores agravantes situações como isolamento social, desemprego, endividamento, desesperança com o excesso de notícias ruins, pessimismo, polarização nas disputas políticas, falta de assistência médica, separações amorosas, contaminação por agrotóxicos, dependência química e acesso a armas de fogo, entre outros.

Nazareno ainda destacou a necessidade de derrubar mitos sobre o assunto, como o que diz que criança não se mata ou afirma que “cão que ladra não morde”, em referência à pessoa que avisa sobre a vontade de tirar a própria vida. É importante reconhecer os sinais, observou. Mais ainda: é essencial derrubar os preconceitos em relação ao tema, pois isso pode impedir que a ajuda chegue até o potencial suicida.

— Em mais de 90% dos casos caberia um diagnóstico de transtorno mental e o uso de medicamentos que ajudam a restabelecer a pessoa, mas existe preconceito em relação ao problema de saúde mental. Depressão não é frescura, preguiça, nem falta de Deus. Há casos de vários pastores e padres conhecidos que cometeram suicídio. Existe ‘depressão sorridente’, humoristas que tiram suas vidas. Reagir não depende da pessoa. Só sabe o que é depressão quem passou por isso. Uma aproximação diferente é ficar ao lado da pessoa, respeitar, acolher e encaminhar para ajuda especializada — afirmou.

CVV

Leila Heredia, porta-voz do Centro de Valorização da Vida (CVV) reforçou a ideia. A “escuta empática”, o “pronto-socorro emocional”, sigiloso e livre de julgamento é o que muitas vezes consegue aplacar a angústia de quem está pensando em se matar. Esse acolhimento respeitoso no contato telefônico, esclarece, não substitui o atendimento especializado, mas pode evitar o ato de dor e desespero.

A ligação para o número 188 agora também é gratuita, uma conquista obtida em acordo de cooperação técnica com o Ministério da Saúde. A expectativa é chegar este ano a de 3 milhões de ligações. Além do telefone, o serviço voluntário também atende por chat, e-mail e pessoalmente.

— A gente mostra esse dado para demonstrar que quando a pessoa tem um espaço de fala, ela tende a usá-lo. Ela precisa desabafar. Às vezes a angústia é tão grande, que ela está ali no efeito da panela de pressão. Então, à medida que ela fala, vai se acalmando. Às vezes a respiração vai até mudando e ela vai se permitindo sentir um pouco diferente — explicou Leila.

Samu

Quando ocorre a tentativa de suicídio, o Distrito Federal conta com um projeto pioneiro no país, mas que ainda carece de apoio da rede. Andrea Chaves, psicóloga do Núcleo de Saúde Mental do Samu-DF considera essa ocorrência uma emergência médica.

— Nós somos o único núcleo do Brasil a fazer saúde mental em urgência. Acreditamos que é um serviço de urgência porque ninguém vai marcar uma consulta [para isso]. Infelizmente nos meus últimos três plantões, todos tiveram suicídio consumado e cenas de automutilação. E em todos eu tive dificuldade no nosso sistema de Saúde — lamentou.

Capacitação

Para Fernanda Costa, representante da Secretaria de Saúde do governo do Distrito Federal, além dos profissionais de saúde, é importante capacitar outros setores da sociedade. É o caso dos professores e demais profissionais das escolas para identificar os alunos em risco, como aqueles que praticam automutilação. E também para mobilizar os familiares e a articular a rede de saúde.

Na segurança pública, a investigação de crimes virtuais, ameaças e incitação ao suicídio. Também a verificação das normas de segurança para construções e, assim, evitar o acesso de pessoas a lugares altos e perigosos. Além de treinamento para atuação em caso de risco iminente, direcionado a policiais e bombeiros, os primeiros a chegar.

— A mídia é um outro setor que a gente pode identificar como risco ou como proteção. Eu considero a mídia muito parceira porque tem potencial de alcançar muita gente e trazer informações qualificadas. Mas dependendo da forma como abordam o tema, isso tem um risco de um “efeito contágio”. De ter um cuidado ao interpretar dados estatísticos, de não fazer sensacionalismo, não identificar uma causa única, não publicar fotos, carta de despedida. E sempre divulgar onde buscar ajuda — ressaltou.

Internet

Juliana Andrade Cunha, coordenadora da ONG Helpline, serviço de orientação psicológica online da SaferNet Brasil é responsável por central nacional de denúncias, em cooperação com Ministério Público Federal (MPF), sobre violações que ferem direitos e dignidade humana.

No trabalho voltado para os maiores alvos de assédio na internet, caso dos jovens, a preocupação é também com a exposição a conteúdos que podem estimular o suicídio: como propagandas de truques de beleza e de dietas miraculosas.

— Muitos adolescentes procuram o canal para falar sobre sofrimento de um modo geral e dúvidas envolvendo saúde mental. A gente sabe que esse conteúdo pode ser sensível, especialmente para colocar em situações de risco, de vulnerabilidade, aquelas pessoas que possam ter algum tipo de predisposição a transtornos alimentares por exemplo.

Doença emocional

Nesse sentido, a psicóloga Patrícia Estrela, especialista em terapia cognitivo-comportamental, defende o autoconhecimento como caminho para uma vida mais plena. Para ela, nem tudo é causado por transtorno mental, mas pela atitude diante das próprias experiências.

— Não só para quem está em depressão, mas para todos nós. Porque eu falo que uma criança preguiçosa hoje é o depressivo de amanhã. Porque os nossos adolescentes estão sendo contaminados. E também estou falando do jovem adulto e do adulto. A gente só fala em desgraça e problema. Doente mental, eu acredito que é uma parcela. A outra parcela é um doente emocional. E existe uma outra parcela que é um doente comportamental, porque nós somos levados a ter comportamentos tóxicos — destacou.

Fonte: Agência Senado


Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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