Morte de Teori afeta debate sobre descriminalização das drogas
Carta Capital – Supremo – por Deutsche Welle
Teori morreu num acidente aéreo, durante viagem de São Paulo para Paraty
Além dos processos da Lava Jato, ministro analisava recurso sobre porte de entorpecentes, tema relacionado à crise nos presídios
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki tinha, por coincidência, sob seu controle exatamente os dois temas que mais perturbam o Palácio do Planalto. Um deles é óbvio e direto: a Operação Lava Jato, da qual Teori era relator no Supremo. O outro tangencia a crise que o presidente Michel Temer passou as primeiras semanas do ano tentando apaziguar: os massacres nos presídios e a evidente falência do sistema penitenciário brasileiro.
Em agosto de 2015, Teori pediu vista do julgamento do recurso extraordinário sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Trata-se de um recurso apresentado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo e que pede ao Supremo a absolvição de um réu por atipicidade da conduta – ele portava 3 gramas de maconha para consumo próprio e foi condenado à prestação de dois meses de serviços à comunidade.
O debate sobre a descriminalização das drogas voltou a ser visto com urgência pela sociedade civil e por autoridades públicas com a crise nos presídios. É quase consenso entre especialistas em segurança pública que o Brasil precisa discutir a diferença entre usuário e traficante de maneira clara para reduzir a superlotação em presídios.
A Lei de Drogas de 2006, segundo especialistas, não solucionou o problema, gerando, na verdade, um efeito contrário, com condenações em série de usuários ou de chamados “microtraficantes”. A lei não determina critérios específicos para classificação de usuários e traficantes, abrindo espaço para avaliação subjetiva dos juízes. Dados do Departamento Penitenciário Nacional de 2014 apontam que 27% da população carcerária foi privada de liberdade por crime relacionado a tráfico de drogas.
Defensores da descriminalização viam com esperança o julgamento no Supremo, já que a tendência do Congresso, cujo perfil atual se mostra mais conservador, é endurecer penas e aumentar as possibilidades de encarceramento.
Havia forte expectativa de que o ministro despacharia o recurso de volta ao plenário até o final de 2016, permitindo ao Supremo retomar o julgamento. Em um de seus últimos e breves comentários sobre o recurso –o ministro evitava falar fora dos autos e sempre adotou a discrição na conduta–, ele esclareceu que analisava legislações de outros países.
Com a morte de Teori, caberá ao novo ministro do Supremo, que será indicado pelo presidente Michel Temer, deliberar sobre os pedidos de vista que estão no gabinete. A escolha do futuro ministro também poderá ter implicação direta no rumo das investigações da Lava Jato, que tem figuras importantes da República na mira do Ministério Público.
O próprio Temer teria sido citado em uma das delações, o que vem a ser a principal causa da instabilidade política de seu governo. Porém, esse novo ministro também será figura crucial nos debates sobre o futuro do sistema carcerário. O julgamento final do Supremo poderá servir de norte para políticas públicas de segurança e contribuir para o arrefecimento de prisões por tráfico.
Dificilmente esse julgamento no STF será retomado no início do ano. O novo ministro deverá ser sabatinado pelo Senado apenas em fevereiro, na melhor das hipóteses. O Congresso estará com as atenções voltadas, nas próximas semanas, à sucessão nas presidências da Câmara e do Senado, que ocorre em 2 de fevereiro.
Após as escolhas dos comandantes das duas casas, os parlamentares precisam escolher os membros das comissões. A sabatina de indicados para o Supremo cabe à Comissão de Constituição e Justiça. Além da votação do nome do ministro na comissão, também há a análise no plenário do Senado, que precisa dar aval à escolha de Temer para a cadeira no Supremo.