Interpretações equivocadas sobre a depressão

22 de março de 202210min89
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*Por Adriana Moraes

“Dor na alma”, “mal do século”, “a beira de um abismo”, “no fundo do poço”, “exaustão”, “último estágio da dor humana”, “fraqueza ou falha de caráter”, “preguiça ou falta de vontade”, diversas metáforas, palavras que lembram a depressão. Entretanto, interpretações equivocadas sobre a doença aumentam o sofrimento psíquico e dificultam muitas vezes a busca por ajuda e por tratamento adequado.

Vivemos em uma sociedade em que estar deprimido é algo aparentemente negativo. A depressão afeta milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Nem sempre é facilmente diagnosticada, podendo desencadear sintomas leves, moderados e graves que afetam tanto o psicológico, quanto o físico. A depressão modifica o funcionamento do cérebro, altera sentimentos, pensamentos e ações.

Estudos realizados indicam que a causa da depressão é a combinação de fatores genéticos, biológicos, ambientais e psicológicos, é provocada por desequilíbrios químicos no cérebro, mais especificamente em neurotransmissores. A hereditariedade tem um peso determinante e vários membros de uma família podem ser acometidos pelo problema. Mesmo pessoas que sempre foram dinâmicas, alegres e otimistas têm depressão, não são apenas os indivíduos mais frágeis que ficam deprimidos. [1]

 Depressão ou tristeza

Tristeza é um sentimento normal, algo passageiro pode durar horas ou alguns dias e não afeta a nossa produtividade, mesmo triste seguimos com nossos compromissos. O indivíduo com depressão apresenta sentimento de melancolia, dificuldade de concentração e na tomada de decisões,  desânimo ou falta de energia, perda da iniciativa, da espontaneidade, sentimento de inutilidade e culpa, choro fácil ou apatia, os sintomas variam de pessoa para pessoa. Todas as fases da depressão trazem intenso sofrimento por períodos maiores ou menores, deixando marcas profundas na vida de quem por ela é acometida, durante o quadro depressivo a tristeza não cessa. A mente depressiva infelizmente evidencia apenas os aspectos negativos, o depressivo acredita em uma crença de um futuro sem expectativas, sem motivação em relação à vida.

Depressão e uso de drogas

A depressão pode intensificar o consumo de drogas e incentivar o indivíduo a fazer o uso de substâncias psicoativas para aliviar o mal-estar. A droga utilizada é capaz de minimizar ou suavizar os sintomas da depressão, porém a abstinência e o uso crônico geralmente acentuam o quadro. Devidos os transtornos decorrentes do uso de substâncias, os dependentes químicos que apresentam quadros de depressão, podem levar mais tempo para reconhecer que estejam deprimidos, podem atribuir sintomas depressivos apenas ao efeito das drogas ou a falta da substância, dificultando assim a busca por tratamento.

Depressão e falta de apetite

Durante um quadro depressivo pode ocorrer alterações no apetite e no peso (ganho ou perda sem relação com dieta). O psiquiatra Augusto Cury compara a depressão com a dor da fome e explica que a depressão é mais intensa do que a dor da fome, pois uma pessoa faminta tem seu apetite preservado e, por isso, se necessário a pessoa revira até o lixo para se alimentar e sobreviver, enquanto algumas pessoas deprimidas podem, mesmo diante de uma mesa farta, não ter apetite e disposição para comer.

Desesperança e sensação de vazio

A desesperança é uma armadilha que a mente produz em um quadro depressivo, ou seja, o indivíduo passa a não ter mais nenhuma esperança de que as coisas podem melhorar, passa a ter descrença em relação a tudo e a todos. O sentimento de desesperança tem sido apontado como importante fator de risco para ideação e comportamentos suicidas.  Para algumas pessoas, o marcante da depressão não é a tristeza profunda, é a angustiante sensação de vazio, de falta de sentido e de ausência de sentimentos.

A depressão afeta a capacidade de sentir prazer ao se fazer coisas que antes eram prazerosas, o que é conhecido pelo termo anedonia, um sintoma marcante da depressão.  O indivíduo com desesperança se percebe anormal, diferente, falho e, diante disso, acredita que não tem valor, subestimando suas potencialidades, não se trata de fraqueza ou falta de vontade, lembrando que as interpretações equivocadas podem levar a percepção distorcida sobre a depressão agravando os sintomas.

Depressão e suicídio

Considera-se suicídio todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de um ato, realizado pela própria vítima. Já a tentativa de suicídio se caracteriza pelo ato, conforme previamente definido, porém interrompido antes que dele resulte morte. [2]

O risco de suicídio varia de acordo com o transtorno mental, sendo associado mais comumente à depressão e aos transtornos por uso de álcool. É bom salientar que nem toda pessoa acometida por depressão irá se suicidar, entretanto, é necessário tomar cuidados especiais com quem sofre, pois dependendo da gravidade da doença há um risco. O comportamento suicida envolve ideação, planejamento, tentativa e suicídio propriamente dito, comportamentos em geral motivados por crenças de desesperança. A depressão pode levar ao suicídio quando a pessoa não recebe a devida assistência.

Veja abaixo, alguns fatores de risco para o suicídio e que se manifestam relacionados aos quadros depressivos: [3]

  • Ter doença incapacitante;
  • Receber diagnóstico de doença;
  • Crises econômicas e dívidas familiares;
  • Viver sozinho e sem perspectiva;
  • Perda de laços familiares;
  • Desemprego;
  • Humilhação ou desonra;
  • Luto ou perda de entes queridos;
  • Agressividade e impulsividade;
  • Histórico de internação com quadro depressivo;
  • História de quadro depressivo ao longo da vida;
  • Internação hospitalar;
  • Ter transtornos psiquiátricos;
  • Histórico de abuso de álcool e outras drogas;
  • Histórico de tentativa de suicídio;
  • Se há grave distúrbio do sono ou alimentar;
  • Uso de medicamentos antidepressivos;
  • Ter alteração constante de humor;
  • Ter plano suicida.

A perda de qualquer esperança, a impossibilidade de vislumbrar motivos que levem à vida e o desespero por não conseguir encontrar uma saída para essa situação pode levar o indivíduo a acreditar erroneamente que o suicídio seria sua melhor opção. Identificar os sintomas da depressão no seu estágio inicial e procurar ajuda especializada é fundamental para evitar que a doença seja fatal.

A depressão é um transtorno mental grave, se não tratada corretamente, pode persistir por muito tempo, com sérios prejuízos à vida do indivíduo.  Existem inúmeros tratamentos altamente eficazes para todos os tipos de depressão, que podem fazer toda a diferença e reverter o quadro depressivo e diminuir os casos de suicídio.

Referências

[1] Botega, Neury José. Crise Suicida: Avaliação e manejo. Porto Alegre: Artmed, 2015.
[2]http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872014000200008
[3] https://pebmed.com.br/setembro-amarelo-a-depressao-e-a-ligacao-com-o-suicidio/

*Adriana Moraes – Psicóloga da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina) – Especialista em Dependência Química – Colaboradora do Site da UNIAD (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas).


Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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