13 de dezembro de 2024

Depressão e tentativas de suicídio: conheça alguns casos de luta e superação

6 de julho de 202215min5103
artigo06072022

*Por Adriana Moraes

“Queria dormir para sempre”; “Ruminações e cobranças por ânimo”; “Mente torturada pela depressão”; “Estou totalmente desmotivada”; “Dor na alma”, são algumas frases das pessoas com depressão que citarei neste texto e uma delas não suportou o sofrimento e resolveu pôr fim à própria vida

Provavelmente, todos nós passamos por algum momento de tristeza em nossas vidas. A tristeza é um sentimento normal e não afeta nosso dia a dia, geralmente algo do nosso cotidiano nos deixa tristes ou melancólicos e, mesmo desanimados, conseguimos cumprir com os nossos deveres, com as nossas tarefas. Mas, se a tristeza se tornar profunda e permanecer, pode ser um sinal de depressão. Quem nunca teve depressão geralmente a imagina como uma tristeza, uma onda de baixo astral que pode melhorar a partir do esforço pessoal. Mas, infelizmente, apenas força de vontade, sozinha e em determinada fase da doença, não é o suficiente para se recuperar da depressão.

O número de pessoas acometidas por quadros de depressão está aumentando e, em muitos, casos pode ser fatal, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 300 milhões de pessoas vivem com a doença no mundo. Mesmo a depressão sendo reconhecida como doença, muitos acreditam que para melhorar basta pensar positivo, mas a falta de motivação é um dos sintomas emocionais da doença. Algumas frases ditas por amigos e familiares, como por exemplo: “você tem que reagir, tem que se esforçar para melhorar” são comuns e têm o intuito de animar a pessoa deprimida, mas o efeito é o contrário, ela fica cada vez mais deprimida. A doença a impede de reagir e a pessoa deprimida entra em um ciclo do desânimo.

Ciclo do desânimo 

O transtorno depressivo faz com que a pessoa entre em um ciclo de desânimo: sente-se muito desanimada para realizar qualquer atividade e, ao mesmo tempo, sente-se mais desanimada porque não está conseguindo realizar nada.  Mesmo sabendo de suas obrigações, não consegue tomar iniciativa, pois a depressão impede a nossa capacidade de tomar decisões e a pessoa deprimida só consegue ver o lado negativo de tudo.

Pessoas com depressão

Cito cinco casos de conhecidos com depressão, infelizmente, um deles não suportou o sofrimento e encerrou sua vida.  Entretanto, é importante destacar que, com a descoberta precoce da doença e tratamento adequado, pode-se reduzir as taxas assustadoras de suicídio.

Mariana (nome fictício), separada, com 30 anos de idade, 02 filhas menores, entrou em um quadro depressivo e optou pelo suicídio, foi salva por uma de suas filhas que pediu socorro. Mariana sentia uma tristeza profunda, era muito vaidosa, ruminações e cobranças por ânimo só a deixavam pior, ela foi aos poucos se entregando à doença, perdeu o interesse e o prazer pela vida. A pessoa neste estado parece ser incapaz de perceber outras maneiras de enfrentar seus problemas. Mariana, no momento, faz tratamento de depressão e prevenção ao suicídio, está se sentindo melhor. Importante alertar de que suas filhas também necessitam de ajuda, afinal ver a mãe tentar se matar foi algo gravíssimo. Mariana apresenta melhora do humor e disposição para cuidar e até para passear com as suas filhas.

– Lúcio (nome fictício) casado, com 40 anos de idade, sem filhos, enfermeiro, atua na área da saúde mental. Sentia-se ansioso, preocupado e extremamente cansado, passou a sentir uma dor psíquica intolerável, não buscou ajuda e tentou o suicídio. Foi socorrido, ficou alguns meses internado, se recuperou e no momento faz tratamento psiquiátrico. Lúcio já salvou tantas vidas, motivou muitas pessoas, mas devido a sua mente estar torturada pela depressão, desejou morrer. Lúcio não via outras alternativas. Ele segue realizando o tratamento, sendo constantemente monitorado, participa de um grupo de prevenção ao suicídio, tem uma rede de apoio com acompanhamento psiquiátrico e psicológico, sente-se melhor e se arrepende do que fez.

– Paulo Sérgio (nome fictício), casado, com 61 anos de idade, 02 filhos, empresário, sentia insônia de madrugada, fadiga e perda de energia quase todos os dias. Estava esgotado, apresentava um forte sentimento de desesperança, a falta de perspectiva do futuro fazia Paulo Sérgio sentir vontade de morrer, dormir para sempre era seu único desejo.  A ideia de morrer, inicialmente rejeitada, passou a ser vista como a única saída para um tormento insuportável, mas buscou ajuda psiquiátrica, mesmo achando que psiquiatra é para louco. Atualmente, o empresário está medicado, se sentindo melhor e já começa a fazer planos para o futuro, que outrora não faziam mais sentido, pois não se via no futuro. Ele reconhece que o tratamento tem sido essencial para readquirir suas forças, bem como a vontade de viver.

– Beth (nome fictício) casada, com 40 anos de idade, 03 filhas, foi diagnosticada com depressão, transtorno bipolar, fobia (medo intenso de morrer). Tinha uma vida tranquila, mas após perder seu emprego, foi dominada por uma sensação de medo e de incapacidade, estava totalmente desmotivada.  A depressão causou uma dor profunda, que parecia não ter fim. Beth percebeu que sozinha não iria conseguir voltar a ter prazer pela vida e solicitou ajuda psiquiátrica, tem esperança de que com tratamento farmacológico e psicoterapia irá melhorar, aos poucos está aprendendo a controlar seus pensamentos negativos. Porém, Beth ainda continua se fechando no escuro do seu quarto.

Marlene (nome fictício) casada, com 50 anos de idade, 02 filhos, enfermeira chefe,  tinha depressão há muitos anos. Familiares informaram que ela se sentia infeliz, desesperançosa e que sempre dizia sentir dor na alma, mas por vergonha não buscou ajuda e, inesperadamente, ela resolveu pôr fim à própria vida. O estigma impede as pessoas acometidas pela doença de procurar ajuda. Mesmo sendo da área da saúde, Marlene, assim como outras pessoas com depressão, sentia-se constrangida, incomodada por estar doente.

É muito difícil você ouvir alguém dizer que a vida perdeu o brilho e nada mais faz sentido! Talvez a parte mais relevante deste texto seja mostrar que das cinco pessoas que citei, todas com nomes fictícios, quatro estão recebendo ajuda especializada e permanecem realizando tratamento. Marlene e Lúcio, enfermeiros não buscaram ajuda e o final de Marlene foi triste, o suicídio é a consequência mais trágica da depressão.

A área da enfermagem carrega uma carga emocional muito forte e um nível de estresse e exaustão muito grande. Por causa do estigma e do preconceito, muitos profissionais evitam procurar ajuda e com isso os problemas aumentam e a depressão impede de enxergar outras saídas para interromper a dor e o sofrimento profundo.

A depressão tira a motivação e a alegria de viver, a vida fica sem graça. Neury Botega, no livro “A tristeza transforma e a depressão paralisa: um guia para pacientes e familiares”, explica que a desesperança de mãos dadas com a anedonia (incapacidade de sentir prazer, um dos sintomas da depressão), alimenta a sensação de que a alegria de viver nunca mais voltará, a depressão tira as cores e o encanto da vida.

Depressão e desesperança

Um dos mecanismos da depressão é a desesperança, a falta de perspectiva e ausência de crenças positivas em relação ao futuro pode aumentar o risco do indivíduo experimentar o desejo de interromper sua vida. A pessoa que apresenta sintomas de desesperança tende a prever o futuro sem expectativas, perde a motivação pela vida e seu desejo de viver é arruinado. Importante prestar atenção nos pensamentos comuns de uma pessoa desesperançosa, como por exemplo:

“Eu não tenho nada a esperar, as coisas nunca vão melhorar”; “Eu não vejo nada melhorar, não há razão para viver”; “Eu não consigo suportar a vida, jamais poderei ser feliz”; “Eu sou um peso para os meus familiares, é melhor que fiquem sem mim”; “Eu me sinto infeliz e só tenho uma saída”. Percebe-se que, com esses pensamentos, o indivíduo não consegue vislumbrar outra saída, que não seja acabar com a própria vida, único meio que acredita ter para lidar com seus problemas sem solução.

Diagnóstico da depressão e causas da depressão

Quando alguém tem o diagnóstico de depressão, toda sua vida é paralisada, para muitos já estava interrompida, os quadros depressivos levam a um grande comprometimento na qualidade de vida, quanto maior a tristeza, a melancolia, maior o isolamento ou a culpa por não estar de bem com a vida. A depressão pode aparecer do nada, às vezes, depois de instalado o quadro depressivo, procura-se justificá-lo com algum acontecimento recente, o que é uma simplificação em relação à multicausalidade do problema. A depressão ocorre devido a uma combinação de fatores genéticos, biológicos, ambientais e psicológicos, não sabemos as causas exatas da doença, mas pessoas que passaram por eventos adversos durante a vida (desemprego, luto, trauma psicológico) são mais propensas a desenvolver a patologia.

Tratamento

A depressão é uma doença tratável, é essencial identificar os sintomas e buscar ajuda médica de um psiquiatra. A depressão pode ser classificada entre leve, moderada e grave. Dependendo da gravidade da doença, o psiquiatra poderá indicar o uso de antidepressivos em conjunto com a psicoterapia. Quadros leves da doença no qual a depressão interfere pouco na vida diária, isto é, a pessoa ainda consegue manter sua rotina, embora isso já exige algum nível de esforço, costumam responder bem ao tratamento psicoterápico e não necessitam de remédios. Os antidepressivos não causam dependência, são eficazes, mas levam semanas para fazer efeito.

Onde buscar ajuda

Você sofre com a depressão? Se você apresenta os sintomas ou conhece alguém com depressão, busque ajuda o mais rápido possível. Vimos neste texto que a depressão não é frescura e pode levar ao suicídio. O SUS (Sistema Único de Saúde) oferece o serviço de tratamento psiquiátrico totalmente gratuito, nas UBS (Unidade Básica de Saúde) e nos CAPS (Centro de Atenção Psicossocial). A depressão e os transtornos mentais precisam de atenção e de tratamento adequado para garantir uma boa qualidade de vida, é imprescindível o acompanhamento do médico.

Referências:

[1] Botega, Neury J. A tristeza transforma, a depressão paralisa: um guia para pacientes e familiares / Neury J. Botega – São Paulo: Benvirá, 2018 – 296p.
[2] http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872014000200008

*Adriana Moraes – Psicóloga da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina) – Especialista em Dependência Química – Colaboradora do Site da UNIAD (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas).


Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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